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#CaliSchäffer | Um certo vazio na nossa história

Meu pai era um homem bom. Era prestativo. Fez muita coisa em favor da nossa comunidade nos mais diversos setores em que atuou sem esperar agradecimentos, muito menos elogios. Também nunca se preocupou em dar publicidade ao trabalho que realizava. Fazia tudo em silencio, com humildade, uma característica da sua personalidade.

Embora procedesse assim em suas relações públicas, particularmente tinha o louvável hábito de registrar praticamente tudo o que fazia, como por exemplo, os registros das transações cotidianas, onde anotava as contas que pagava, e todas as informações que pudessem ter alguma utilidade para a história da nossa família e a da cidade.

Mantenho arquivada toda a correspondência que ele escreveu a amigos, políticos, autoridades, fazendo recomendações pessoais bem como as de interesse da coletividade. Sem ter exata consciência do que ele fazia com os documentos que criava e conservava – isto me passou desapercebido – adquiri o mesmo hábito: mantenho arquivadas cópias de tudo o que escrevo e até ampliei, fazendo anotações de assuntos pessoais num diário, que no final do ano mando encadernar. Até escrevi um livro, onde registrei a história da nossa família e as minhas lembranças.

Uma coisa, porém, ele não fez. O Pai nunca disse nada sobre a sua infância e adolescência. Nunca o ouvi contar histórias de travessuras ou brincadeiras de que tivesse participado quando criança. Muito menos sobre seus sonhos, aspirações juvenis ou eventuais dificuldades que tenha enfrentado depois de adulto, no decorrer da vida.

Nesse ponto específico ele não escreveu, não falou, mas também nunca reclamou de nada.
Sempre o vi como um homem de temperamento tranquilo, olhar bondoso, que irradiava certa melancolia, humano, porém sério, ensimesmado, nem um pouco extrovertido. Lamentavelmente constatei que quando o tempo começa a apagar da nossa lembrança certos fatos e acontecimentos das nossas vidas, se não os registrarmos logo, nunca mais teremos a oportunidade de colher essas informações, que nos permitiria fazer reviver mais detalhadamente o nosso passado.

Tomo a liberdade de escrever isto para recomendar a todos que conversem com seus país, com seus avós, e busquem saber deles, da forma mais minuciosa possível, tudo sobre as suas vidas, desde o início. Eu fui um tolo em não procurar saber de meu Pai esses pormenores. Apesar de todos os meus cuidados, a oportunidade que perdi é agora irrecuperável.

“Devem-se considerações aos vivos; aos mortos deve-se apenas a verdade”
Voltaire

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