“Todo Dia A Mesma Noite“, minissérie ficcional sobre o incêndio na Boate Kiss, em 2013, estreou na Netflix na última quarta-feira (25). A produção detalha o momento da tragédia, o drama e a luta pela sobrevivência dos jovens que frequentavam a casa de festas e a perseverança dos pais das vítimas em busca por justiça.
A minissérie é inspirada no livro homônimo da autora Daniela Arbex, que entrevistou sobreviventes, familiares das vítimas, equipes de resgate e profissionais da saúde envolvidos no caso. Os relatos das vítimas presentes na obra literária serviram como inspiração para a construção dos personagens da minissérie.
Entretanto, por se tratar de uma obra ficcional, e não documental, a produção acrescenta detalhes e cenas que podem não ter acontecido exatamente como ilustrados pela plataforma de streaming. Por consequência, os personagens da minissérie possuem nomes diferentes das vítimas da vida real, afinal, caso as verdadeiras identidades dos sobreviventes e falecidos fossem mantidas, a minissérie teria que, por obrigação, ser completamente fiel aos fatos.
Apesar dessa distinção, não é difícil fazer uma associação entre os personagens da minissérie e as verdadeiras vítimas do incêndio. Com base em entrevistas fornecidas pelos sobreviventes e pelos familiares das vítimas fatais ao longo da última década.
Silvio Beuren Júnior, conhecido como Silvinho, tinha 31 anos e era o único de quatro filhos que ainda morava com os pais. Ele cuidava de uma fazenda da família em São Pedro do Sul e se dizia apaixonado pelo campo. Desde que tinha terminado seu último namoro, Silvinho não tinha conseguido se envolver afetivamente com ninguém. Ele estava em busca de uma companheira, pois sonhava em construir uma família, assim como seus outros irmãos. Na noite do incêndio, ele foi para a boate encontrar com amigos e morreu no local, trancado com outras pessoas no banheiro superlotado.
Gustavo Cauduro Cadore era estudante de medicina veterinária e tinha 31 anos quando foi vítima do incêndio na Boate Kiss. Naquela noite, ele havia combinado com um amigo de ir para uma balada, mas ao passarem na frente do local, perceberam que estava muito cheio. Eles, então, decidiram ir à Kiss, que também tinha uma grande fila na área externa, mas optaram por ali ficar. Incomodado com a superlotação, Gustavo logo quis ir embora, mas foi convencido pelo amigo a permanecer no local.
Quando o incêndio começou e as luzes do estabelecimento se apagaram, Gustavo tentou sair do espaço, mas foi pisoteado por outras pessoas durante aproximadamente dois minutos. Após finalmente conseguir se levantar, ele demorou cerca de oito minutos até conseguir sair do local. Ele teve 40% do corpo queimado, fez sete cirurgias e ficou com restrição na mão direita.
Augusto Sérgio Krauspenhauer da Silva, o Guto, tinha 20 anos e era descrito por todos como um rapaz simples, tímido e que estava sempre com um sorriso discreto no rosto. Na noite do incêndio, ele havia combinado de buscar o irmão caçula, Júlio, em outra festa exatamente às 03h30 da manhã. Guto, no entanto, não apareceu no horário combinado. Júlio soube, através de seus amigos, que a Boate Kiss pegou fogo e ligou imediatamente para seus pais.
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Nadir Krauspenhar e Sérgio da Silva, pais de Guto, foram imediatamente ao local. Ao chegarem na casa de festas e notarem a multidão, Nadir teve a ideia de olhar no estacionamento do Carrefour, onde muitos clientes da Boate Kiss estacionavam seus carros. Sérgio, então, começou a apertar o botão para destravar o carro, para confirmar se seu filho havia conseguido ou não sair do local. O casal caminhou por diversos veículos e não encontrou o carro. No entanto, quando estavam prestes a deixar o estacionamento, o alarme do carro disparou e os pais de Guto tiveram a certeza de que o filho não havia conseguido fugir.
Kelen Giovana Leite Ferreira era uma frequentedora da Boate Kiss e tinha 19 anos na época do incêndio. Ela foi à festa na noite da tragédia acompanhada de duas amigas, que morreram no local. Kelen foi retirada da casa de festas graças à ajuda de Gustavo Riet, de 34 anos, que ela nem conhecia.
A jovem teve 18% do seu corpo queimado e precisou amputar parte da perna direita. Ela ficou 78 dias internada no Hospital de Clínicas em Porto Alegre, sendo 15 dias em coma, e se formou em Terapia Ocupacional após se apaixonar pela área durante o processo de reabilitação.
Gustavo Riet, de 34 anos, havia ido à Boate Kiss na noite do incêndio para encontrar com Juliana Bassan, uma nova paixão que ele havia conhecido no dia anterior. Ele chegou ao local cerca de 10 minutos antes de começar o incêndio. Escapou, mas retornou diversas vezes para ajudar outras pessoas a se salvarem, sendo uma delas a anteriormente citada Kelen Ferreira.
Andrielle Righi da Silva, conhecida como Andri, foi à Boate Kiss para comemorar seu aniversário de 22 anos acompanhada de suas duas melhores amigas e outros seis amigos. Quando o incêndio começou, a aniversariante e suas amigas conseguiram sair do local e foram encaminhadas ao hospital. Elas chegaram a dar entrada no estabelecimento, mas não resistiram por terem inalado a fumaça tóxica gerada pela queima da espuma.
Rafael Paulo Nunes de Carvalho, de 32 anos, morava em Santo André, no ABC Paulista, e viajou à Santa Maria naquele final de semana para encontrar com um grupo de amigos que ele havia conhecido durante um intercâmbio na Nova Zelândia. Ele havia embarcado para o sul na quinta-feira e, ao entrar no avião, enviou uma mensagem para Paulo Tadeu Nunes Carvalho, seu pai, dizendo: “Amo vocês”.
Meses após a morte do filho, Paulo e sua esposa receberam a visita de uma amiga de Rafael, que os revelou ter engravidado dele pouco antes da tragédia. O casal ficou entusiasmado ao descobrir sobre a existência de um neto.