O infarto, historicamente, é um problema associado a homens e idosos. Conforme a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), essa visão, no entanto, contrasta com uma nova realidade de hoje da doença. A SBC observa nos últimos anos que, enquanto a mortalidade cai no âmbito geral, há um crescimento no número de casos entre mulheres de 18 a 55 anos.
A entidade pede uma maior atenção à saúde cardiovascular feminina e aos devidos cuidados de prevenção, diagnóstico e tratamento.
“A incidência e a prevalência da DIC (doença isquêmica do coração) vêm diminuindo no Brasil ao longo dos últimos 20 anos em mulheres e homens, embora tenha ocorrido aumento na mortalidade precoce por DIC entre 18 anos e 55 anos, especialmente nas mulheres”, diz o documento publicado no periódico Arquivos Brasileiros de Cardiologia.
“O reconhecimento, a discussão, a educação e o tratamento apropriado da DIC nas mulheres são necessários para reduzir os gaps (gargalos) no diagnóstico e tratamento, além dos desfechos desfavoráveis nas mulheres”, observa o posicionamento.
A DIC, também conhecida como doença arterial coronariana, isquemia cardíaca ou isquemia do miocárdio é um quadro caracterizado pela diminuição da passagem de sangue pelas artérias que levam o sangue ao coração devido ao seu estreitamento. Em muitos casos, é resultado do acúmulo de placas de gordura (aterosclerose). É a principal causa de morte no país.
Segundo o novo documento da SBC, a DIC, embora ainda seja a principal causa de morte de homens e mulheres, passou por uma queda geral significativa de aproximadamente 50% entre os anos 1990 e 2019.
Entretanto, a mesma tendência não foi observada entre as mulheres mais jovens. A professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Gláucia Maria Moraes de Oliveira, membro da comissão executiva do Departamento de Cardiologia da Mulher da SBC, explica que isso acontece devido a uma “questão multidisciplinar”.
“As mulheres jovens são submetidas hoje a uma grande quantidade de fatores de risco que não tinham antes. Embora estejam fumando menos, há mais obesidade, mais sedentarismo, mais diabetes. E para além disso, elas têm uma carga emocional enorme, um estresse muito grande, uma dupla, tripla jornada de trabalho. Tudo isso propicia o aparecimento da doença isquêmica do coração. E como não é dito que as mulheres têm infarto, principalmente as jovens, elas demoram a ser atendidas no pronto-socorro, os médicos demoram a reconhecer o infarto e elas têm um desfecho ruim”, avalia a especialista, que fez parte da elaboração do novo posicionamento.
Além disso, “as mulheres apresentam maior frequência de fatores de risco cardiovascular (FRCV) não tradicionais, como estresse mental e depressão, e sofrem maior consequência das desvantagens sociais devido a raça, etnicidade e renda. As mulheres têm ainda os fatores de risco que são inerentes ao sexo, como gravidez, menopausa e menarca, entre outros”, explica o documento.
Glaucia conta que, diante do cenário, todos os departamentos que abordam a saúde da mulher da sociedade se reuniram para elaborar o posicionamento. Além de fazer o alerta, o texto propõe novos protocolos que, de maneira resumida, envolvem uma maior atenção à doença, um melhor preparo dos profissionais da saúde para reconhecer os sintomas e fazer o diagnóstico entre mulheres e um maior acesso ao tratamento.
“É necessário unir os atores para aumentar a conscientização sobre a saúde cardiovascular das mulheres e que, ao apresentarem dores que muitas vezes não são típicas, como falta de ar e dor nas costas, elas procurem o pronto-socorro. Pedimos que essas mulheres busquem mais rapidamente auxílio, especialmente se elas tiverem fatores de risco, como tabagismo, obesidade, histórico na família de doença coronariana crônica, sedentarismo e hipertensão arterial. Essas informações também precisam chegar não só às mulheres e aos cardiologistas, mas a todos os médicos que cuidam de mulheres. E é preciso melhorar o acesso aos tratamentos, e que eles sejam oferecidos no tempo correto”, defende a cardiologista.
A entidade também cita que menos de 50% das pacientes são submetidas ao tratamento medicamentoso adequado. Menciona, ainda, que grande parte dos infartos nas mulheres são devido à “Minoca”, que é o evento sem uma doença obstrutiva, ou seja, sem a interrupção do fluxo sanguíneo.
Nestes casos, os desfechos costumam ser consideravelmente piores nas mulheres do que nos homens, especialmente entre as mais jovens.
Em relação aos sintomas que podem acender o alerta no sexo feminino, a sociedade destaca que a dor torácica é um indicativo em ambos, porém as mulheres são mais propensas a apresentar sinais chamados de “atípicos”, como náuseas, vômitos, dor nas costas e no pescoço, falta de ar, indigestão, ardência na pele, dor nos ombros, no rosto, na mandíbula, fadiga incomum e palpitações.