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Homem com superanticorpos contra o coronavírus é descoberto nos Estados Unidos

John Hollis, portador de superanticorpos imunes ao coronavírus e suas variantes. Foto: BBC

O estadunidense John Hollis passou duas semanas com uma pessoa que ficou muito doente em função da Covid-19, mas não foi atingido pelo coronavírus. “Por duas semanas eu esperei a doença me atingir, mas nunca aconteceu”, conta.

Em conversa com o médico Lance Liotta, professor da Universidade George Mason, onde Hollis trabalha na área de comunicação, ele contou seu caso, que acreditava ser apenas sorte. O professor e pesquisador, que estuda formas de combater o vírus, convidou John para voluntariar-se em um estudo científico na universidade.

Com isso Hollis descobriu que não só tinha contraído o covid-19, como seu corpo tinha superanticorpos que o tornavam permanentemente imune à doença. Isso significa que os vírus entram em seu corpo, mas não conseguem infectar suas células e deixá-lo doente. “Essa tem sido uma das experiências mais surreais da minha vida”, declara.

Na maioria das pessoas, os anticorpos que se desenvolvem para combater o vírus atacam as proteínas das espículas do coronavírus — formações na superfície do Sars-Cov-2 em formato de espinhos que o ajudam a infectar as células humanas. “Os anticorpos do paciente grudam nas espículas e o vírus não consegue grudar nas células e infectá-las”, explica Liotta. Em pessoas que nunca entraram em contato com o vírus, ele se espalha mais rápido que a produção dos anticorpos pelo organismo, deixando, assim, a pessoa doente.

Mas os anticorpos de Hollis são diferentes: eles atacam diversas partes do vírus e o eliminam rapidamente. Eles são tão potentes que o estadunidense é imune inclusive às novas variantes do coronavírus. “Você poderia diluir os anticorpos dele em 1 para mil e eles ainda matariam 99% dos vírus”, explica Liotta.

Os pesquisadores estudam esses superanticorpos do comunicador e de alguns outros poucos pacientes como ele na esperança de aprender como melhorar as vacinas contra a doença. “Nós coletamos o sangue de Hollis em diferentes momentos e agora é uma mina de ouro para estudarmos diferentes formas de atacar o vírus”, informa Liotta.

Viés racial em pesquisas

Descobertas como essa muitas vezes não acontecem por causa de um viés racial em pesquisas científicas: a maioria delas é feita com pacientes brancos. A participação de negros em estudos tende a ser muito menor do que sua porcentagem na sociedade.

“Há um longo histórico de exploração (de pacientes negros) que faz com que a comunidade afro-americana tenha desconfiança em relação à participação em pesquisas”, afirma Jeff Kahn, professor do Instituto de Bioética da Universidade John Hopkins. “É compreensível que haja essa desconfiança”, afirma.

O estudo de sífilis de Tuskegee, feito com a participação de afro-americanos se tornou conhecido, pois, por mais de 40 anos, cientistas patrocinados pelo governo dos Estados Unidos estudaram homens negros que tinham sífilis no Alabama sem prover medicamentos para a doença.

“Ao longo dos anos, durante a produção do estudo, antibióticos se tornaram amplamente disponíveis e não foram oferecidos a essas pessoas. Os pesquisadores mentiram sobre o que estava sendo feito com eles, que tiveram tratamento negado em nome da pesquisa”, explica Kahn.

“Quando o estudo de Tuskegee veio a público, foram criadas regras e regulamentos para pesquisas em seres humanos, que estão em vigor desde os anos 1970. Queremos garantir que as comunidades que são mais afetadas estejam recebendo os benefícios das tecnologias sendo desenvolvidas”, afirma Kahn. “E, para isso, essas populações precisam também ser parte de estudos.”

“Nós devemos honrar aquelas pessoas, as vítimas do estudo de Tuskegee, através do envolvimento em um processo para garantir que aquilo não aconteça de novo. E também para salvar vidas, especialmente na comunidade afro-americana, que tem sido fortemente atingida pela pandemia”, diz Hollis.

“Protegermos uns aos outros é um dever a nós mesmos e às pessoas que amamos”, afirma o escritor.

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