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As religiões e os finados

Poucas coisas causam tanta dor quanto a morte de alguém querido. Quando alguém está passando por isso, é comum ficar se perguntando: Até quando eu vou me sentir assim? Será que algum dia vou ser feliz de novo? O que posso fazer para me sentir melhor?

Em toda cultura há uma atenção especial dirigida aos mortos, podendo estar relacionada ou não a alguma religião. Orar pelos mortos, reverenciar a data dedicada a eles, intensifica a dor da perda, mas também conforta e aquece o coração. E, em muitos entendimentos, eleva o espírito, a alma dos que já partiram, para o Paraíso.

Assim como são diversos os ritos de sepultamentos conhecidos ao longo da história, como a cremação, o enterro em covas, em “gavetas” e em urnas de cerâmica ou de pedra, mais antigamente a mumificação e a deposição do corpo dos mortos em mausoléus, são diversas as formas de entendimento e de honra à memória dos mortos.

Nos países do Ocidente, o dia 02 de novembro é dedicado à memória dos que já partiram do campo físico. Esse dia foi popularizado pela tradição católica, mas faz parte também da cultura de outras religiões, como a evangélica, a adventista, a umbanda e também a testemunhas de Jeová.

Todas essas manifestações religiosas estão representadas em Encantado. Para entender um pouco sobre como cada grupo religioso compreende, interpreta e atua no Dia de Finados, conversamos com os dirigentes de algumas congregações.

Enterros
O funeral é sempre um dos momentos mais dolorosos para quem perde um ente querido, mas há sempre um membro da família ou amigo próximo que consegue equilibrar melhor as emoções para dar andamento às questões burocráticas inerentes ao velório e ao sepultamento. A escolha pelo cemitério é uma das decisões a serem tomadas.

Em Encantado, são cerca de 30 cemitérios existentes, sendo dois no centro da cidade (o São Pedro e o Santo Antão) e os demais localizados nas comunidades do interior.

Neles, são enterrados os mortos de todas as religiões. Não há cemitério evangélico. “A relação entre a Igreja Católica e as Igrejas Evangélicas, nesse momento, é de união”, diz o pastor Waldir Grooders. No caso das Testemunhas de Jeová, a situação se assemelha. “Não há cemitério específico; é uma decisão da família”, diz Alcemar.

Horário das missas na quarta-feira

As missas no Dia de Finados serão celebradas pelos três padres que atuam na Paróquia São Pedro, nos cemitérios de oito comunidades, além da Igreja Matriz. Os horários são os seguintes:

Às 8h30min: nos cemitérios dos bairros Santo Agostinho, Santo Antão e na comunidade São Carlos, no Jacarezinho.
Às 10h: nos cemitérios São Pedro e das comunidades de Linha Auxiliadora e Linha São Joaquim/Lajeadinho.
Às 15h: nos cemitérios das comunidades de Linha São Roque e São Máximo/Barra do Guaporé.
Às 18h: na Igreja Matriz.

COMUNIDADE CATÓLICA

Foto: PADRE GENOIR PIETÁ

O Dia de Finados foi instituído inicialmente no século X, na França, pelo abade Odilo (Santo Odilon, 962-1049). Odilo de Cluny sugeriu, no dia 02 de novembro de 998, aos membros de sua abadia que, todo ano, naquele dia, dedicassem suas orações à alma daqueles que já se foram. A visão, naquela época, era de que boa parte das almas dos mortos está no Purgatório, passando por um processo de purificação para que possam ascender ao Paraíso, e que estando no estado de purgação, as almas necessitam, segundo a doutrina católica, de orações dos vivos, pedindo a misericórdia divina e a intercessão dos santos, da Virgem Maria e de Jesus Cristo.
Essa prática de orar pelos mortos tornou-se bastante popular na Europa entre os séculos X e XV, ficando conhecida como “Dia de todas as Almas”. Com a descoberta da América e o processo de colonização, o dia 2 de novembro tornou-se ainda mais popular. Nos dias atuais, o Dia de Finados continua a ser uma data especial, na qual a memória dos entes queridos que já se foram nos vêm à mente e na qual, também, milhões de pessoas vão aos cemitérios levar suas flores, velas, sentimentos e orações.
De acordo com o representante da igreja católica no município, padre Genoir Pieta, no dia 02 de novembro, a Igreja Católica faz a memória de todos os fiéis defuntos. “Qual é o significado dessa celebração?”, questiona. O padre, que é administrador paroquial, diz que, apoiada no mistério da união de todos em Cristo, a Igreja quer nesse dia lembrar todos os falecidos, oferecendo orações e sufrágios para ‘pagar possíveis dívidas’ deixadas por eles. “Trata-se de rezar pelas almas benditas do Purgatório, para que sejam livres de todo resquício de pecado e, quanto antes, possam gozar da plenitude da vida junto de Deus. Por sua vez, elas podem interceder junto a Deus em nosso favor. É a chamada “Comunhão dos santos”, pela qual podemos nos ajudar uns aos outros: os da terra, os do purgatório e os que estão no paraíso.”

 

IGREJA DO EVANGELHO QUADRANGULAR

Foto: Pastor Waldir Grooders

Finados é um dia de recordação e de belas lembranças dos amigos e familiares que se foram. Sabemos que a morte não é o fim de tudo. Os justos, como o ladrão arrependido e crucificado ao lado de Jesus, que foi ao Paraíso no mesmo dia, os injustos, como o outro ladrão, terão que esperar até o Dia do Juízo. Essa é a concepção dos evangélicos integrantes da Igreja do Evangelho Quadrangular. “Não falamos com os mortos, mas somos a favor que qualquer dia, durante o ano – quando sentirmos saudades de alguém que faleceu – podemos levar flores honrando o seu corpo enterrado, mas infelizmente poucos fazem isto, restando assim, o Dia de Finados”, declara o pastor Waldir Grooders, titular da congregação no município.
Conforme Waldir, crê-se também na promessa de Jesus no Arrebatamento. “Primeiro, daqueles que morreram em Cristo, onde os túmulos se abrirão e os mortos em Cristo ressuscitarão, e depois nós, que estivermos vivos, subiremos com eles para encontrar o Senhor Jesus Cristo nos ares e estarmos para sempre com Ele na casa do Pai”, explica, citando a passagem bíblica 1 Tessalonicenses 4:16-17.

ASSEMBLEIA DE DEUS

Foto: Pastor Agnaldo Rossatto

Romano, nós, evangélicos, vemos nela um momento de lembrar-se dos entes queridos e amigos que já partiram”, diz o pastor da igreja em Encantado, Agnaldo Rossatto.

Ele cita, também 1 Tessalonicenses 4: 13-14: “ Não quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem, para que não vos entristeçais, como os demais, que não têm esperança. Porque, se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também aos que em Jesus dormem, Deus os tornará a trazer com ele.”

Na prática, conforme o casal de pastores, Agnaldo e Gehias, os evangélicos desta congregação não fazem nenhuma liturgia, nem visitam túmulos neste dia. “Apenas oramos pelos familiares, para que Deus os conforte, e também a nós”, completa.

 

TESTEMUNHA DE JEOVÁ

Foto: Pastor Alcemar Gonçalves de Souza

 

Cada pessoa tem sua própria maneira de lidar com a dor e não existe um jeito certo ou errado; tudo depende da criação, da personalidade, do que ela passou na vida e do tipo de perda que ela sofreu.

“A Bíblia mostra que não há nada de errado em ter sentimentos fortes e persistentes, mas ela também fala de algumas atitudes que podem ajudar, como ter paciência, viver um dia de cada vez, respeitar o seu ritmo e lembrar que a tristeza não vai durar para sempre”, orienta o presidente da congregação em Encantado, Alcemar Gonçalves de Souza, porta voz da Congreção.

As Testemunhas de Jeová não celebram o Dia de Finados. Eles aproveitam esse dia para compartilhar com outras pessoas o consolo da Bíblia. “O Atos 20:35 diz: ‘há mais felicidade em dar do que em receber.’ Ou seja, quando você reserva um tempo para ajudar outras pessoas, você acaba ajudando a si mesmo. Uma maneira simples de fazer isso é conversar com pessoas que também estão sofrendo com a morte de alguém querido”, destaca.

 

 

 

 

 

UMBANDA

Foto: Pai Eduardo

Religião de matriz africana, a Umbanda está representada em Encantado pelas Casas Centro Afro Sete Flechas e Oxum, comandada por Mãe Odete, e Centro Afro Xangô e Oxum, comandada por Pai Eduardo.

Para os umbandistas, 2 de novembro é dia de São Lázaro, que é considerado o dono da vida e da morte, estando ligado ao fim da vida, que representa um ciclo, uma caminhada.

“Dedicamos esse dia à memória dos que já faleceram; é um dia de luto bem marcante e a maioria das casas aproveita para reverenciar as ancestralidades de todos os entes queridos que participaram delas e hoje estão no céu”, explica Pai Eduardo.

Os representantes do candomblé também são católicos. “Somos praticantes do catolicismo cultuando a tradição afrodescendente. Todo dia de finados vamos ao cemitério, acendemos velas, mandamos rezar missa, assistimos a missa, nossa diferença está muito mais nos atos fúnebres do que nas comemorações de finados”, diz.

 

COMUNIDADE CRISTÃ

Foto: Pastor Armando

Nesta congregação, o Dia de Finados não faz parte do calendário litúrgico. É considerado um tema sensível, que toca nas memórias e emoções das pessoas. “É um tanto difícil opinar a respeito, uma vez que a conotação poderá parecer negativa”, diz o pastor Armando

Segundo ele, a comemoração desse dia decorre de várias implicações doutrinárias, contexto histórico e tradições da Igreja Católica. Os evangélicos desta congregação não creem num estado intermediário das almas, no qual as orações possam mudar o destino eterno dos mortos.

“Cremos, conforme as Escrituras nos ensinam, que a decisão sobre a eternidade deve ser tomada em vida, mediante a aceitação da graça de Deus, revelada em Seu Filho Jesus Cristo: “Quem crê não será julgado; o que não crê, já está julgado, porquanto não no nome do Unigênito Filho de Deus”. (João 3.17).

Acerca de finados, procuram honrar a memória dos mortos lembrando o bom testemunho de vida que deixaram. “Mas não temos uma data ou algum cerimonial específico em que façamos isso”, completa.

 

 

 

OS FINADOS PARA OS HAITIANOS E SENEGALESES

Foto: Yveto Slin

No Haiti, o Dia dos Mortos também é um feriado nacional. Os católicos acordam pela manhã, rezam a missa e visitam os cemitérios levando flores para ornar as tumbas nos cemitérios.

A maior parte dos imigrantes que se estabeleceram em Encantado mantém no catolicismo a sua religião e seguem esse costume no dia 2 de novembro. Os que aderiram à religião evangélica, como é o caso de Yveto Slin, seguem a orientação de sua congregação.

Há dez anos no município, Yveto diz que, em vários sentidos, inclusive religiosos, não há problema em se adaptar à cultura daqui. A principal diferença, segundo ele, também está no funeral.

“Quando a pessoa morre, a família conserva o corpo o máximo de tempo que conseguir, podendo ser meses, dependendo a condição financeira. No Haiti, o povo tem um local preparado para receber os corpos falecidos; aqui, nos ajustamos ao costume tanto do funeral quanto da comemoração aos mortos”, explica.

 

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