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Por que o RS sofreu com a estiagem enquanto SC registrou chuva acima da média em 2022

Especialistas apontam as características que diferenciam os dois Estados na questão climática

Enquanto o Rio Grande do Sul sofreu com a estiagem ao longo de 2022 em boa parte do Estado, na vizinha Santa Catarina os pluviômetros explodiram durante o ano passado. Em algumas áreas catarinenses, choveu quase mil milímetros acima do esperado.

Segundo o meteorologista da Defesa Civil de Santa Catarina, Murilo Fretta, a situação atingiu a Grande Florianópolis, o Planalto, o Litoral Sul e o Vale do Itajaí. Em dezembro do ano passado, por exemplo, em Santo Amaro da Imperatriz, na região metropolitana, onde costuma chover entre 150 mm e 200 mm no período, foi registrado volume três vezes maior do que a média. Em território catarinense, as chuvas intensas provocaram enchentes, estradas bloqueadas, deslizamentos e mortes, como as duas adolescentes de Camboriú que morreram soterradas em 20 de dezembro.

Conforme Fretta, os principais meses com chuva acima do que é esperado em 2022 foram março, maio, junho, agosto, novembro e dezembro no litoral catarinense. No oeste, os períodos foram abril, maio, agosto e outubro. O meteorologista cita o fenômeno La Niña entre as causas da quantidade de chuva que caiu no Estado vizinho, aliada a outras situações.

Quando falamos de precipitação, anomalia, questões climáticas, precisamos levar em conta não só este fenômeno (La Niña) de grande escala. Outras oscilações interferem nas condições de tempo e clima em menores escalas, que chamamos de sub-sazonais, ou seja, entre as estações, com períodos que podem variar entre 20 e 70 dias, como o Madden-Julian (perturbação de nuvens, chuva, vento e pressão em movimento para o leste que atravessa o planeta nos trópicos e retorna ao seu ponto inicial em 30 a 60 dias), a Oscilação Quasi-Bianual (variação regular dos ventos que sopram bem acima do Equador) ou a Oscilação Antártica (relacionado com mudanças na posição da corrente de jato, sistemas frontais, ciclones e anticiclones) e todas as interações entre esses fenômenos — explica Fretta.

No período em que a chuva intensa castigava os catarinenses, no Rio Grande do Sul, a região oeste padecia esperando por alguma precipitação. O resultado é que o ano terminou com déficit hídrico de 250 mm naquela região, segundo o Centro Polar e Climático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). No leste do Estado gaúcho, que inclui Porto Alegre e a Região Metropolitana, faltaram 150 milímetros para alcançar a média anual.

— O fenômeno La Niña contribui para a diminuição da precipitação no Estado, que já entrou 2023 com déficit hídrico. Estamos precisando de chuva. Diferentemente do que ocorre em Santa Catarina, que fechou 2022 com valores superiores de quase mil milímetros acima do esperado — comenta Francisco Eliseu Aquino, professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e diretor substituto do Centro Polar e Climático da mesma instituição.

Estiagem afeta produção agrícola gaúcha

Para piorar a situação dos gaúchos, a estiagem deste verão começou no meio da primavera, ainda em novembro do ano passado, conforme o o diretor-técnico da Emater, Alencar Paulo Rugeri, com chuvas irregulares e com volume não uniforme. Por conta disso, até esta segunda-feira (23), 141 municípios gaúchos decretaram situação de emergência, segundo a Defesa Civil. Destes, 53 já foram homologados pelo Estado e 42 foram reconhecidos pela União. O número ainda pode aumentar.

A falta de chuva em solo gaúcho afeta diretamente a produção agrícola.  Segundo dados da Emater, a região de Santa Maria enfrenta as maiores dificuldades, seguida pelas áreas de IjuíSanta Rosa e Frederico Westphalen. A Emater estima que cerca de 6 mil produtores estão com dificuldade de abastecimento de água  no Estado, com casos de pouco estoque ou problemas na qualidade.

Sistema de monções

Mas como explicar tamanha diferença entre os climas nos dois Estados vizinhos em meio ao fenômeno La Niña? A professora do curso de Meteorologia da Universidade de Federal de Santa Maria (UFSM) Simone Ferraz explica que a América do Sul tem um sistema de monções, um regime de chuvas específico para a região.

Hoje em dia, a comunidade científica considera que, praticamente, qualquer área continental tropical é uma região de monção. Os cientistas destacam o fenômeno na América do Sul, da América do Norte, da África — que vai de Serra Leoa até Madagascar — e da Índia, do sudeste asiático até o norte da Austrália.

Conforme Simone, o sistema de monções da América do Sul atua do sudeste do continente, atingido desde a região amazônica até Santa Catarina com um mesmo sistema de chuva bem definido entre períodos de muita precipitação e de estiagem, ao longo de 12 meses.

Já o Rio Grande do Sul e um pequeno pedaço do sul catarinense, alerta Simone, têm chuvas mais uniformes durante todo o ano. O sistema é parecido com o que ocorre no Uruguai e no norte da Argentina, porque eles sofrem este impacto e também estão fora desse sistema de monções da América do Sul. Por isso, o Rio Grande do Sul tem um regime pluviométrico diferente do restante do Brasil e muito mais parecido com os países vizinhos.

— O sul (do Brasil) também não é o sul do Brasil inteiro. Basta ver como estamos agora, com o La Niña. Todos falam que com La Niña não chove no Sul, mas é só olhar para o que está acontecendo com Santa Catarina e Paraná. O Rio Grande do Sul faz parte, na verdade, do sul da América do Sul, com Uruguai e Argentina. A gente precisa pensar mais em sul da América do Sul, do que em sul do Brasil (quando se trata de clima). O nosso impacto é muito mais parecido com o que acontece nos países vizinhos ao Estado do que ocorre em Santa Catarina — destaca a professora da UFSM.

Fonte
GZH
Agro Dália

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