#CaliSchäffer | Até quando, Catilina?
Muitos anos atrás, era comum que livreiros me visitassem, todos os meses, oferecendo livros de todos os tipos que entregavam no mesmo momento da visita. Um deles, no decorrer do tempo, acabou se tornando meu amigo.
Certa feita, forçado a fazer uma cirurgia no braço, por recomendação médica fui obrigado a ficar em casa, em repouso. Em decorrência dessa situação que se criou, liguei para esse livreiro, expliquei a ele o meu problema, e pedi que ele me trouxesse livros, mas nenhum que tratasse sobre direito. Com impressionante rapidez, possivelmente em razão nossa da amizade, no dia seguinte de manhã ele aparece na minha casa com uma Caravan lotada de livros, tanto, que o motor apontava para o céu e o porta malas quase que se arrastava pelo chão. De todos os que trouxe comprei duas coleções. Uma, magnífica, que trata sobre diversos assuntos, denominada Clássicos Jackson, com 40 volumes, e a outra, de Cesare Cantu, sobre História Universal, com 32. Tinha livros para ler por muito tempo.
Comecei pelos Clássicos, e no volume 11 encontrei as Orações, de Cícero, filósofo e político considerado o maior orador de Roma. Nelas, tive a oportunidade de conhecer, na íntegra, As Catilinárias, que foram os quatro discursos que Cícero proferiu no senado romano contra Catilina.
Catilina tinha sido pretor e governador na África, Pediu várias vezes o cargo de cônsul, que lhe era sistematicamente recusado por causa de sua má conduta e pelos insultos que cometera contra a República. Indignado com essas recusas revoltou-se contra Roma em várias ocasiões, das quais foi a principal a última. Queria tomar o poder a qualquer custo, e preparava-se para cometer um golpe de estado. Por sua ordem, seguidores seus haviam até preparado a realização de incêndios em diversos pontos da cidade com o objetivo de criar um clima de terror. Cícero, com atos e discursos, impediu que esse atentado fosse consumado.
No primeiro discurso que recitou no Templo de Júpiter Stator, para onde havia convocado os senadores, Cícero disse, entre outras coisas, claro, contra Catilina, o seguinte:
“Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda há de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há de precipitar a tua audácia sem freio? Nem a guarda do Palatino, nem a ronda noturna da cidade, nem os temores do povo, nem a afluência de todos os homens de bem, nem este local bem protegido para a reunião do Senado, nem o olhar e o aspecto destes senadores, nada disto conseguiu perturbar-te? Não sentes que os teus planos estão à vista de todos? Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem? Quem, de entre nós, pensas tu que ignora o que fizeste na noite passada e na precedente, em que local estiveste, a quem convocaste, que deliberações foram as tuas? Oh tempos, oh costumes! ”
Aqui no Brasil vivemos também hoje em dia tempos e costumes estranhos. Já é motivo mais do que suficiente para nunca esquecermos dos quatro discursos que Cícero proferiu contra o tirano Catilina.