#ColunaDaMari | Inconstitucional é a palavra da vez

Certa vez, um homem que conversava com meu pai, ao descobrir que eu era sua filha, me definiu com a seguinte frase: “Eu já vi gente gostar de política, mas como a tua filha, não vi igual”. De fato, meu gosto pela política surgiu muito cedo, em meados dos anos 90. Era o tempo em que a distribuição de brindes ainda não era proibida e as agremiações partidárias reuniam seus simpatizantes nos tão esperados “showmícios”, com comes e bebes.
De lá para cá, muita coisa mudou. Vieram a Lei de Responsabilidade Fiscal, a proibição de as Câmaras Municipais firmarem parcerias com entidades para ajuda de custos de qualquer espécie, a Lei do Teto de Gastos, a Lei de Acesso à Informação e tantas outras, todas com o objetivo de tornar a gestão pública mais transparente e eficiente. O que não mudou foi o significado da palavra “inconstitucional”: continua sendo aquilo que contraria a Constituição de qualquer país.
Atualmente, o assunto mais debatido na Câmara de Vereadores de Encantado é a constitucionalidade — ou não — de atos normativos propostos pelos parlamentares. Para quem acompanha a política há tantos anos como eu, isso causa incômodo. Afinal, o Regimento determina que todas as matérias enviadas pelo Executivo ou apresentadas pelo Legislativo tenham pareceres jurídicos das Comissões Permanentes da Casa. Esses pareceres, elaborados por assessoramento especializado, são tratados como consultivos, o que está dentro da legalidade e do processo regimental. Até aí, tudo certo.
O problema está no critério dos “dois pesos e duas medidas”. Situações semelhantes acabam recebendo tratamentos diferentes, dependendo do interesse em jogo. Em resumo: quando convém, é inconstitucional; quando não convém, aprova-se do jeito que está. Essa prática gera transtornos e custos desnecessários ao Executivo, que, por lei, é obrigado a vetar certas matérias ou ingressar com ações de inconstitucionalidade. Caso contrário, pode sofrer sanções dos Tribunais de Contas. Além do impacto administrativo e financeiro, o maior prejuízo é para a população, que acaba alimentando falsas expectativas. E todos sabemos: a maioria das pessoas confia nos seus representantes.
Minha opinião é clara: quem pensa em se candidatar a qualquer cargo eletivo precisa, no mínimo, conhecer as atribuições do cargo, entender como funciona o setor público, saber o que pode ou não ser feito e, principalmente, ter noção do que é possível oferecer à comunidade. Infelizmente, a cultura do “pedir” do eleitor persiste há gerações e continua sendo alimentada por aqueles que almejam o status de representante. Pedir faz parte do jogo; prometer o que não pode ser cumprido, não.
Alimentar a ilusão de que algo inconstitucional pode ser realizado é injustiça em qualquer lugar do mundo. E jogar a culpa no Executivo pelo que não pode ser feito é ainda mais abominável. É triste constatar que boa parte da população também só se importa com o que lhe convém e muitas vezes responsabiliza as pessoas erradas por não ver suas “demandas atendidas”. Enquanto o ego falar mais alto que o espírito público, nada vai mudar. Continuaremos sendo iludidos, presos à velha política do toma lá, dá cá.