Cada vez mais brasileiros veem pets como filhos
Uma tendência criticada pelo papa está crescendo. E cada vez mais os pets estão sendo vistos como filhos e parte da família
As pessoas que têm animais de estimação sabem o amor que esses animais dão aos seus donos. O amor é tanto que os pets acabam sendo considerados membros da família. Nesse ponto, em uma tendência que parece estar crescendo entre o brasileiros: casais estão optando por não ter filhos e acabam tendo cães e gatos “ocupando” o lugar dos filhos.
Essa tendência pode ser vista de uma maneira positiva por várias pessoas. No entanto, no dia cinco de janeiro, o papa disse em um de seus encontros com fiéis às quartas-feiras que existe um “determinado egoísmo” nessa prática.
“Há dias, falei sobre o inverno demográfico que há atualmente: as pessoas não querem ter filhos, ou apenas um e nada mais. E muitos casais não têm filhos porque não querem, ou têm só um porque não querem outros, mas têm dois cães, dois gatos. Pois é, cães e gatos ocupam o lugar dos filhos. Sim, faz rir, entendo, mas é a realidade. Esta negação da paternidade e da maternidade diminui-nos, cancela a nossa humanidade”, disse o papa Francisco.
Famílias multiepécie
A tendência é tão grande e parece que veio para ficar que, nas ciências humanas, ela já ganhou até um nome. Os humanos e seus pets estão formando as chamadas “famílias multiespécies”. Tanto que a psicóloga Cássia Alves, junto com sua orientanda na graduação, Melanie de Aguiar, publicaram um artigo sobre o tema em 2021.
Mesmo que haja uma resistência na sociedade no reconhecimento dessa relação dos pets como familiares, isso já está chegando à Justiça. Por exemplo, com contratos e litígios sobre a guarda dos animais depois de um divórcio.
“A gente não sabe como vai ser daqui para frente, mas eu entendo que essas novas configurações, por exemplo, a inclusão dos pets nas famílias multiespécie, permite que as relações sejam mais efetivas, que as pessoas possam decidir o que elas querem. Efetivas no sentido da escolha do seu desejo, o que você quer para sua vida. Muitas famílias no passado tiveram filhos por ser algo esperado, e hoje a gente tem mais possibilidades de escolha. Não mais se pensa, hoje culturalmente, que o filho é a única possibilidade de trazer uma felicidade para o casal, como um destino. Hoje a gente pensa a vivência das mulheres, dos homens, para além da maternidade e da paternidade”, concluiu Alves.
Pesquisa
A Radar Pet 2021 mostrou que os casais que adquiriram um gato durante a pandemia, o principal perfil eram os que não tinham filhos. Com relação aos cachorros, o perfil predominante foi de pessoas morando sozinhas. E a pandemia foi um momento forte para aquisição de pets. De acordo com a pesquisa, 30% deles foram adquiridos neste período.
Outro ponto que a pesquisa abordou foi perguntar aos donos como eles enxergavam seus pets. Ou seja, como filho, membro da família, amigo, companhia, bicho de estimação ou uma forma de assistência.
Os resultados mostraram que de 2019 para 2020, o número percentual de donos considerando os pets como filho e membro da família cresceram. E curiosamente diminuiu o percentual daqueles que os viam como bichos de estimação.
Pets como filhos
A funcionária pública Andreza Alcântara, de 37 anos, é uma dessas pessoas que considera o pet como filho. Casada há 13 anos, quase o mesmo tempo de vida do seu cachorro, a bull terrier Kirah, de 14, ela diz que sofre a pressão para ter um filho, mas que considera Kirah como sua filha.
“Quanto a essa fala do Papa, eu discordei. Primeiro, ele não tem filhos. E ele teria que ver que hoje não é fácil colocar uma pessoa no mundo, está tudo muito difícil. Não é procriar por procriar. Esse deveria ser um tema de saúde pública em um país como o nosso, com tanta desigualdade, tanta gente passando fome. As crianças vêm ao mundo e não têm culpa de passar pelo que passam”, pontuou.
Andressa faz parte de uma tendência vista pela pesquisa anual da Comissão de Animais de Companhia (Comac) do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Saúde Animal (Sindan), a Radar Pet. Esse levantamento representa o nicho de lares brasileiros das classes A, B e C e tem uma margem de erro de 3,6% com um intervalo de confiança de 95%.
Fonte e imagens: BBC