Em protesto, estudantes pedem revogação da reforma do Ensino Médio
Ato ocorreu em frente ao Colégio Estadual Júlio de Castilhos
Estudantes e professores de escolas públicas protestam em diferentes cidades brasileiras na manhã desta quarta-feira (15) pedindo a revogação da reforma do Ensino Médio. Em Porto Alegre, o ato ocorreu em frente ao Colégio Estadual Júlio de Castilhos.
Com gritos de guerra, cartazes e bandeiras de movimentos políticos, o grupo, composto majoritariamente por adolescentes, se concentrou em frente à escola do bairro Farroupilha às 9h. Por volta das 10h, foi iniciada uma aula pública, com estudantes, professores e políticos ligados à esquerda se revezando no microfone na defesa da revogação.
— Esse modelo não favorece os alunos, favorece o sistema. Ele não nos ensina a seguir o que a gente quer fazer, mas sim o que eles querem que a gente faça. Só quem é aluno, que tem dificuldade para entrar na universidade, que tem que sair do colégio para trabalhar e sustentar a família, que sabe a realidade — opina Camila Rodrigues, 18 anos, estudante do Instituto Rio Branco.
A jovem relata que muitos colegas estão insatisfeitos com a reforma e que alguns têm preferido abandonar a escola e, depois, fazer o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja), para obter a certificação.
Estudante da Escola Técnica Estadual Senador Ernesto Dornelles, Luiza Suarez Moraes, 15 anos, conta que em muitas instituições de ensino professores que se formaram em outras áreas de conhecimento estão dando aulas de disciplinas como Projeto de Vida e Mundo do Trabalho.
— Tem disciplinas que até seriam boas de se estudar, mas não do jeito que está previsto nessa reforma, que não foi conversada com os professores e nem com os estudantes. Além do quê, a gente não tem nenhuma garantia de que no Enem a gente vai conseguir escolher essas trilhas de aprendizagem ou se vai ficar um buraco no nosso ensino — observa Luiza.
No dia a dia da escola, a adolescente reclama que houve uma redução de carga horária de disciplinas como Química e Física para que se tenha aulas de Mundo do Trabalho, por exemplo, onde se aprende a confeccionar um currículo. Luiza ainda destaca a dificuldade que é uma pessoa tão jovem escolher qual caminho quer seguir.
— A gente está em constante transformação, mas não pode ficar mudando de trilha de aprendizagem sem perder uma boa parte do que já fez — comenta.
Cláudia Dreier, professora de Geografia, está ministrando uma disciplina de Direitos Humanos e Diferentes Culturas no Colégio Estadual Florinda Tubino Sampaio. Como também é formada em Jornalismo, acredita que sua experiência prévia tem facilitado o processo de ensinar sobre o assunto, mas sabe que não é o que acontece com a maioria de seus colegas.
— A maioria tem o seu conhecimento sobre aquela área e, de repente, está deixando de passar esse conhecimento, que pode ser super importante para a vida da pessoa, para o vestibular, e começa a ensinar coisas diferentes que tu não sabe muito bem como ensinar, porque a gente não recebeu nenhum treinamento de como fazer isso — pontua a docente.
João Alberto Rodrigues é diretor do Colégio Estadual Coronel Afonso Emílio Massot e é contrário ao Novo Ensino Médio porque entende que ele gera uma precariedade ainda maior no ensino.
— A reforma gera um efeito cascata na formação dos professores, porque um Ensino Médio que retira horas de aulas de Ciências Humanas, da Natureza e de Linguagens está colaborando com uma formação mais precária desse estudante, o que, por consequência, reduz ainda mais a chance dele no Enem, no vestibular e outros concursos que vierem a fazer. O abismo entre escolas privadas e públicas aumenta ainda mais — alerta o diretor.
A manifestação ocorre após a abertura, na semana passada, de uma consulta pública por parte do Ministério da Educação sobre o assunto. Pressionada por entidades de Educação e especialistas da área, a pasta realizará audiências públicas para ouvir a comunidade a respeito das mudanças instituídas desde o ano passado.
Com lei sancionada em 2017 e implementada desde o ano passado, a reforma do Ensino Médio está sendo questionada por especialistas e entidades ligadas à educação desde que foi proposta. Esses questionamentos ganharam força nos últimos meses.
Entenda a mudança
A mudança trouxe novas disciplinas e tornou uma parte do currículo flexível para os estudantes. Em 2022, a reforma passou a abranger as turmas de 1º ano do Ensino Médio. Nessa série, porém, o currículo ainda é semelhante ao antigo, apenas com a inclusão de três novas disciplinas: Projeto de Vida, Mundo do Trabalho e Cultura e Tecnologias Digitais.
Foi agora, em 2023, que a transformação principal começou: esses estudantes ingressaram no 2º ano, quando se inicia a parte flexível da carga horária. Nela, os alunos podem escolher entre duas ou mais áreas para aprofundarem seus conhecimentos. Na rede estadual do RS, por exemplo, há 28 trilhas de aprendizagem possíveis, e cada escola precisa oferecer ao menos duas.