O Setembro Verde, da esperança, trouxe vida nova para Edson Barcelos Carneiro, de 43 anos. Ele sofria de nefropatia por IgA, doença que provoca insuficiência renal crônica. Desde 2019, as sessões de hemodiálise passaram a fazer parte da rotina. Há sete meses, foi incluído na lista de pacientes que aguardam um transplante de rim. Foi o ato de amor de uma família de São Paulo que pôs fim à espera do porto-alegrense
“É uma atitude muito nobre e que salva vidas. Sou muito grato a essa família. Tenho muita vontade de viver e eles resgataram a minha felicidade”, declara Edson. O paciente destaca o papel das campanhas em prol da doação de órgãos e a importância das pessoas manifestarem o desejo de serem doadoras. Para quem segue na fila, ele manda um recado positivo. “Não desistam! Acreditem que é possível!”, incentiva.
Edson teve alta no dia 22, está bem, com o rim funcionando, e agora completa a recuperação em casa. A doadora era uma mulher de 55 anos. O órgão veio para o Hospital Moinhos de Vento via Central de Transplantes. Foi o primeiro transplante renal com doador falecido realizado na instituição.
O nefrologista David Saitovitch reforça o significado do ato das famílias que aceitam doar órgãos de um ente querido num momento de dor. “Mesmo o Brasil sendo uma referência mundial — com um Sistema Nacional de Transplantes que funciona muito bem e com um povo solidário, que se mobiliza quando é incentivado pelas campanhas — existe um hiato muito grande entre a quantidade de pacientes que entram anualmente em lista de espera e o número de potenciais doadores. Então, cada família que consente, que aceita fazer a doação, está salvando várias vidas”, pontua o médico.
O transplante
A cirurgia realizada no dia 5 de setembro marca a retomada de transplantes de órgãos no Hospital Moinhos de Vento, após dois anos sem realizar este tipo de procedimento, em função da pandemia. O Grupo de Transplante Renal é formado pelas equipes de nefrologia, cirurgia geral, urologia e time multidisciplinar, capacitado para fazer transplantes tanto com doador vivo como com doador falecido. A equipe assistencial promove o elo e vínculo sólido com o paciente, apoiando na organização e logística de todas as etapas e fluxos do programa.
David Saitovitch acrescenta que a instituição oferece medicina de ponta e uma excelente estrutura para cirurgias com doadores vivos, além da equipe altamente qualificada, com atuação nacional e no exterior. A retirada do órgão é feita 100% por laparoscopia, o que garante um procedimento menos invasivo e com tempo de recuperação mais rápido, com alta em cerca de três dias. “Todos os transplantes já realizados no Moinhos com doadores vivos foram um sucesso. Agora esperamos que essa cirurgia que marcou a nossa retomada, além de inaugurar procedimentos com doador falecido e nos colocar na lista de espera por transplantes no Rio Grande do Sul, seja a primeira de muitas — e que a gente consiga cumprir a missão de salvar mais vidas”, ressalta.
COVID-19 e queda das doações
Incentivar a doação de órgãos se tornou ainda mais urgente com a pandemia. Um levantamento da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) revelou uma queda de 26% nas doações no país desde março de 2020. Transplantes de pulmão (62%), rim (34%), coração (34%) e fígado (28%) foram os procedimentos que tiveram maior impacto. Segundo a médica do Centro de Terapia Intensiva Adulto do Hospital Moinhos de Vento, Patrícia Balzano, as principais causas seriam o risco de contaminação, a redução e/ou a suspensão de cirurgias eletivas, a falta de leitos em UTIs, além da suspensão de voos para transporte dos órgãos.
A projeção para 2020 era de que o Brasil teria 20 doadores de órgãos por milhão de pessoas. Com a pandemia, o número de doadores regrediu aos patamares de 2017: foram 15 por milhão de habitantes.
Recusa familiar é um desafio
O Brasil possui uma alta taxa de recusa familiar, na comparação com outros países. Em torno de 42%, ou seja, quase metade, não consentem a doação. Patrícia explica que o manejo adequado do potencial doador e o aperfeiçoamento da comunicação com a família contribuem para melhorar esses números. Ela lembra que a doação também pode ser feita ainda em vida, no caso de órgãos como rim, parte do fígado, parte do pulmão e medula óssea.
A psicóloga do Centro de Terapia Intensivo Adulto do Hospital Moinhos de Vento, Anelise Fiori da Silva, salienta que é fundamental as pessoas declararem o desejo de serem doadoras, pois é uma forma de deixar seus familiares cientes e mais tranquilos na hora de tomar essa decisão.
Pioneirismo e medicina de ponta
Foi em 1970, no Hospital Moinhos de Vento, que aconteceu o primeiro transplante de rim do Rio Grande do Sul e o segundo no Brasil. A paciente era uma adolescente de 15 anos. Os cirurgiões Loreno Brentano e José Carlos Dihel operaram, respectivamente, a receptora e sua mãe, que doou um rim para a filha. Elas ficaram aos cuidados do nefrologista Otto Busato.
Desde 2015, a instituição também conta com um programa específico voltado ao transplante de medula óssea. Até o momento, foram realizados 161 procedimentos. Também é o único hospital privado no Rio Grande do Sul que oferece todos os tipos desse tratamento: autólogo (quando a medula vem do próprio paciente), alogênico aparentado (de um familiar) e alogênico não aparentado (de um terceiro). Em 2018, o Moinhos também foi credenciado a realizar também transplantes de fígado.